Artesanato do Maranhão

Destaques

Armadilhas de pesca

Jandir Gonçalves e Paula Porta

Diferentes armadilhas de pesca com estratégias no modo de pescar inteiramente adaptadas às condições do ambiente pesqueiro, das águas e aos tipos de peixes que se pretende capturar, retratam pescarias individuais e coletivas em todo Maranhão. Um diversificado conjunto de pequenas armadilhas é utilizado pelas gentes do Maranhão que vivem próximo ao salgado, aos rios, aos lagos, às lagoas, às baixas, aos poções, às croas.

As armadilhas de pesca, com sua grande variedade, são produzidas em 90% dos municípios já mapeados, por mais de 820 artesãos (20% deles são mulheres). Essa presença tão relevante faz desse artefato um destaque do artesanato maranhense.

Algumas regiões concentram maior número de artesãos da pesca, como a Baixada Maranhense, com seus vastos campos inundáveis, a região do rio Caru, ao norte; o Baixo Paranaíba, a leste; a região do rio Munim, próxima à capital e cidades como Turiaçu e Mirinzal. A maior parte dessa produção é realizada lugares situados na Amazônia e no Cerrado.

A natureza oferece matéria-prima diversa para a produção das armadilhas: madeiras (como o marajá que tem um tronco fino e é bastante dura), cipós, talos e talas das folhas das palmeiras, guarimã, fio de algodão... são algumas das mais utilizadas. Há também uma grande produção de redes e tarrafas de fibra e de fio de nylon.

O cuidado nos acabamentos e a beleza das formas desses artefatos evidenciam a qualidade do design popular, criações em muitos casos herdadas das culturas negras e indígenas e mantidas ou transformadas ao longo do tempo.

Muitos artesãos produzem miniaturas das armadilhas de pesca para uso decorativo.

As armadilhas são produzidas por homens e mulheres, estas dedicam-se principalmente às peças tecidas com agulhas: redes, tarrafas, landruás e puçás. É bastante comum ver mulheres e homens tecendo nas portas das casas ao entardecer.

Choque

O choque - que também é conhecido como socó, currú, quengo ou quixó - é utilizado para pescar no campo inundável, mas também nos lagos e nos igarapés ou em lugares onde o nível da água não ultrapasse muito a altura do joelho.

O choque é feito sob medida para o braço do pescador, mas muitos artesãos produzem um tamanho médio, que pode servir para o público em geral. O pescador que vai choquear costuma levar um cofinho de cintura/ cofo de pescaria, onde guarda o resultado da pesca.

O choque pode ser feito com talas de marajá (por sua dureza é a madeira mais utilizada) ou com varas de diversas madeiras e cipós (sendo as mais utilizadas: papaterra, pé de galinha, quina e murta), também foi encontrada peça feita com talas de cano PVC.

Os arcos internos são feitos de cipó, de madeira vergável no fogo como a jeniparana/ juruparana ou de metal (aro de ferro ou arame). 

Choque de talas de marajá

Choque de varas

As amarrações das talas ou varas nos arcos são de dois ou até três tipos, presentes em uma mesma peça. No topo e no arco central em geral se utiliza a amarração escama de cascudo ou a  cruzada. Na borda se usa uma amarração dupla. Os materiais mais empregados são o fio de nylon com cera de abelha (para que a amarração fique firme), a embira, o cordão de nylon, o arame (na borda), o macarrão de plástico ou, ainda, o fio de telefone.

A principal área de produção dos choques está nos municípios da Baixada Maranhense – com maior concentração em Pinheiro, Bacurituba, Palmeirândia e Arari, mas também há muitos artesãos produzindo em Mirinzal (choque de varas). 

São poucas as mulheres que fazem o choque/ socó, mas há especialistas como Dona Noca, em Palmeirândia e artesãs que fazem por encomenda como Josana, em Anajatuba.

A principal área de produção dos choques está nos municípios da Baixada Maranhense – com maior concentração em Pinheiro, Bacurituba, Palmeirândia e Arari, mas também há muitos artesãos produzindo em Mirinzal (choque de varas).  

Jiquis/ Munzuás/ Matapís

Os jiquís/ munzuás/ matapís são armadilhas de espera, utilizadas nos rios e igarapés. Em geral o artesão posiciona a armadilha no final do dia, contendo isca feita de farinha de mandioca, voltando para buscar o resultado ao amanhecer. Os materiais mais utilizados são o talo de babaçu e as varas de cipó (remela de cachorro, quina, beiço de caçuá, garapuca), mas também foram encontrados materiais como bambu, anajá, bacuri e outros. Há variações feitas com estrutura de madeira ou cipó e redes de nylon. Nas amarrações utiliza-se cipó, embira, macarrão de plástico, barbante de nylon, borracha de câmara de pneu.

Matapís e jiquís são os nomes dados (na maior parte das vezes) às peças que possuem a amarração de um dos lados (por onde se faz a despesca, quando não há uma portinha na lateral) e uma sangra no lado oposto (lâminas de bambu ou taboca), por onde o peixe entra e não consegue voltar. Manzuá ou jiquí de duas bocas é o nome em geral dado às peças com entradas dos dois lados, mas há muita variação de nomes e modelos.

Algumas cidades apresentam especialidade na produção desse tipo de armadilha: Axixá (jiquí de vara de quina), Cajapió (matapí de talos de bambu) e Santa Quitéria do Maranhão (jiquí de varas), elas reúnem (até o momento) o maior número de artesãos de jiquí, mas os jiquís são feitos em todas as regiões do estado.

Gaiolas de pesca

Usadas em conjunto para pesca em rio, as gaiolas redondas ou quadradas costumam ser feitas com varas de cipó ou talas de marajá. As sangras em geral são feitas de taboca ou bambu. Existem gaiolas de uma, duas e até cinco sangras.

As cidades que concentram maior números de artesãos de gaiolas são Pindaré Mirim, Arari e Santa Quitéria do Maranhão, mas há artesãos produzindo em muitos municípios, com variações nos formatos.

Currais e Cacurís

O ambiente costeiro maranhense é permeado por diferentes tipos de currais de pesca. Grandes armadilhas – a serem despescadas com maré vazante – são construídas com estacas de madeira e constam quase sempre de uma sala ou chiqueiro e espias, embora tenham desenhos e tamanhos variados. Também se destacam as antigas camboas ou itaparís, construídas com pedras em algumas praias no golfão maranhense e no litoral ocidental. Existem ainda outras armadilhas estacadas que são sazonais e de grande porte, a exemplo da muruada, da fuzarca e da lance de zangaria.

O cacurí é uma versão pequena e portátil dos currais, usada nos rios e lagoas. É feito com varas e amarrado com cipó. São poucos os artesãos que produzem, é uma armadilha menos utilizada. Foram registrados artesãos de cacurí em Anapurus, Mata Roma, Santa Quitéria do Maranhão, Magalhães de Almeida, Milagres do Maranhão, Centro Novo do Maranhão, Luís Domingues e Boa Vista do Gurupi.

Landruás, Jiracas, Sacurí, Puçás...

Landruá, landuá, jiraca ou sacurí são os nomes mais usados para a armadilha de pesca que também é conhecida por alguns como puçá. Essa armadilha é formada por uma rede/ pano de fio de algodão ou nylon, tecida com agulha de rede de pesca, cuja boca é fixada a um aro ou meio aro de cipó (jeniparana). Sua utilização ocorre nos rios, lavados e ainda nas despescas dos grandes currais. Existe uma variante chamada guizo, específica para a pesca de camarão.

Miranda do Norte reúne muitas artesãs e artesãos que tecem o landruá de fio de algodão.

Peneiras de pesca

As peneiras de pescar são confeccionadas com talas de buriti ou de guarimã, de acordo com a região. Costumam ser feitas para uma, duas ou quatro pessoas pescarem em ambientes de lagos e lagoas com presença de mururus, aguapés e outros.

Tala de buriti

As peneiras de tala/ flecha de buriti são muito presentes na região do Baixo Parnaíba, há diversos artesãos produzindo em Anapurus, Brejo e Buriti

Tala de guarimã

Em algumas regiões as peneiras são profundas e de boca estreita. Traçadas com tala de guarimã, são utilizadas principalmente pelas mulheres. A comunidade quilombola Juçaral dos Pretos, em Presidente Juscelino, reúne artesãos que produzem esse tipo de peneira.

Caminas, Manzuás e Paneiros de pesca (de filho, mãe e filho, boca de pote)

A tala de guarimã é utilizada em para tecer muitas armadilhas de pesca. Chama atenção a diversidade de formatos e modos de utilizar. Além da peneira, existe a camina/ carmina, o munzuá em diferentes modelos e o paneiro com suas variações, paneiro boca de pote, paneiro de amoré, paneiro de filho, paneiro mãe e filho e paneiro munzuá.

Paneiros

Os paneiros de pesca são muito utilizados na região do Carú. Há grande e diversificada produção em cidades como Cândido Mendes, Godofredo Viana, Carutapera. Também são produzidos em Turiaçu.

Caçuás e balaios de pesca

A pesca com cestos de uso individual ou em dupla é bastante comum nos riachos e igarapés. A produção está associada à disponibilidade do material para tecer, são usados principalmente os cipós e a tala de buriti. Os balaios são feitos principalmente pelas mulheres.

Os balaios de tala de buriti são feitos e utilizados principalmente pelas mulheres do Baixo Parnaíba, de cidades como Santa Quitéria, São Bernardo e Santana do Maranhão.

Outras armadilhas

Outros petrechos de pesca, aparecem aqui e acolá como arco e flecha, usados em diversos povoados nos lagos de Viana, Matinha, Cajari; o caixão de pesca, mais incomum; o espinhel usado na água salgada e em grandes rios, ou simplesmente o caniço/vara de pesca.

Tarrafas e redes

Redes de emalhe, arrasto, cerco e tarrafa apresentam variados exemplares como guizo, tainheiro, rede de lanço, gozeira, malhão, serreira, orichoqueira, de balsedo, puçá de escora, cascudeira, rede alta, zangaria, malhadeira (também chamada caçueira)... São tecidas com fio ou fibra de nylon, com diferentes tamanhos de malha, de acordo com o tamanho do peixe a capturar, para serem utilizadas em águas rasas ou profundas.

As redes de pesca são produzidas em todas as regiões do estado, mas algumas localidades são como centros de produção, pois reúnem maior número de  artesãos, como a sede do município de Primeira Cruz, onde se faz caçueiras, pitilzeiras, sabujeiras, puçás de arrasto, puçás de tapagem, tarrafas, dentre outras.

Com a facilidade de compra do pano de rede industrial, feito em fibra de nylon, tornou-se mais raro o tecer da rede de pesca em grandes tamanhos, mas ainda é feita por muitos que também podem fazer somente o entralhe, que é a montagem da rede com as boias, cordas, cordões etc.

As tarrafas são produzidas com regularidade em todas as regiões do estado. Presidente Juscelino, na região do Munim, reúne muitos artesãos e artesãs de tarrafa, assim como Viana, na Baixada Maranhense.

Muitas vezes há divisão entre o trabalho de tecer e o de entralhar (adicionar as cordas, os cordões, tensos, a chumbada...).

Agulhas de tecer rede

ARTEFATOS COMPLEMENTARES

Sucubés e garajaus

O sucubé, também chamado de viveiro, é utilizado para acondicionar grande número de iscas e mantê-las vivas ao longo da pescaria. Tem formato de embarcação pois é atado à lateral do barco e navega com ele. Já o bamburral/ garajau é usado após a despesca das armadilhas, mantendo o peixe vivo por muitos dias.

Cofo para pescaria

O cofo é companheiro inseparável do pescador, para carregar o peixe, o camarão, o caranguejo logo que capturado, para armazenar na embarcação, para transportar, para embalar antes da venda... É certamente o item com maior procura, pois atende a todo tipo de pesca.

É utilizado também como armadilha de pesca, da mesma maneira que se usa a peneira profunda. Para este uso se faz o cofo urupi, que tem a trama aberta.

O acervo de belos artefatos de pesca reunido pelo projeto Mapearte foi exibido na exposição Choque, Landruá, Sucubé, Munzuá... O design da pesca no Maranhão, evidenciando a diversidade e a beleza das peças de uso cotidiano. O catálogo pode ser baixado no link abaixo.

https://ccv-ma.org.br/app/uploads/2020/07/ccvm-catalogopesca-digital-72.pdf